domingo, 30 de junho de 2013

A MADRINHA (3)

A noite, por ali, foi mal dormida. Quando, pela manhã, se encararam uns aos outros, ficou claro que tinham uma preocupação comum: o Meireles. Tentando desviar a atenção do assunto que a todos preocupava, a mãe dirigiu-se ao marido:
      - Vou deixar a lista do que precisamos da mercearia, em cima da mesa da cozinha. Preciso de ir ao Valado dar um jeito na cerca que o gado rebentou, mas estou de volta antes do almoço.
      - Não há pressa – respondeu António- Eu só vou à aldeia, ao fim da tarde.
Alexandre, que lavava umas ferramentas, no pequeno tanque do quintal, ouviu a conversa e pensou para consigo:
     - Vou ter que estar de olho nele. Se o Meireles julga que eu vou permitir que ele o humilhe ou o desrespeite, está muito enganado. O ricaço nem desconfia de com quem se está a meter.

O dia correu normalmente, só perturbado por longos silêncios, pouco habituais. O irmão mais velho passou a maior parte do tempo na forja e Alexandre, juntamente com o pai e o irmão mais novo, ocuparam-se a ultimar uma encomenda, na serração. Por volta das cinco da tarde, o pai deu por findo o trabalho e, virando-se para os filhos, disse:
      - Bem, eu tenho um assunto para resolver. O senhor Vilar vai cá mandar o boieiro, ao fim da tarde, buscar a madeira. O que vocês têm a fazer, agora, é porem a madeira, além, a jeito de carregar.
Nenhum deles fez perguntas, ambos sabiam de que se tratava.
Logo que o pai voltou costas, Alexandre dirigiu-se à serração e disse ao irmão mais velho:
     - Tenho umas coisas para resolver, no povoado. Fazes favor, ajudas o Guilherme a carregar a madeira do Vilar. Eu não me demoro.
      - Não sei se será boa ideia apareceres, por lá. O pai gosta de tratar dos assuntos dele, sozinho.
      - Pois, mas este assunto não é um assunto dele, é meu.

O café, contíguo à velha mercearia do Sr. Antunes, tinha já a marca das novas gerações da família e tinha chegado com o rádio, o telefone e a carreira diária. Àquela hora da tarde, porém, nenhum aldeão comum se podia contar entre a sua clientela. Esta era constituída pelos homens abastados da terra que, deixando aos capatazes a tarefa de supervisionarem os trabalhos nos campos, ali, se juntavam para discutir jornas, preços para as safras do vinho, do azeite ou do figo e – porque não? – as novidades das redondezas.

Nessa altura, a novidade que fervilhava na aldeia, mas a que nenhum dos presentes podia dar voz, por temer a reação do Meireles, era a inclinação de Maria Teresa e de Alexandre um pelo outro. Querendo provocar alguma reação no pai da rapariga e sem coragem para abordar o assunto, o Gouveia comentou:
      - Ontem, fui à Ramada Grande e encontrei o filho do Galvão Teles, em casa do meu cunhado. O rapaz já é quase doutor de leis e o meu cunhado precisava de se aconselhar por causa de uma estrema. Diz que está quase de férias e perguntou pelos teus rapazes e, pela Maria Teresa, se está melhor da febre que a acometeu e se continua a ser a rapariga mais bonita da terra. Lá lhe dei as notícias que, felizmente, são boas, e o rapaz pareceu satisfeito.
      - Ora, aí está, um belo par! E esse, não podes dizer que vem à procura de riqueza, porque isso já ele tem de sobra – opinou o João Matos, não escondendo a expectativa.
O Meireles não se deu por achado, ignorou o que todos os presentes queriam saber e comentou jocoso:
      - Sabem o que lhes digo? Se nós já precisamos dos conselhos dum jovem ainda de cueiros para resolver um caso de estremas, estamos aviados. E virando-se para o neto do Antunes, que servia a cerveja, perguntou:
      - Ouve lá, aquela voz, que eu estou a ouvir vinda da mercearia, não é a do António do Cabeço?
      -  É, sim, senhor – respondeu o jovem
      -  Então, diz-lhe se pode aqui chegar, que eu preciso de falar com ele.

O recado não apressou António. Acabou de fazer as compras, arrumou-as no cesto, ainda deu dois dedos de conversa com a Esmeralda, nora do Antunes, sobre a saúde da sogra e, só depois, se dirigiu ao café. Quando assomou à porta, os copos ficaram suspensos no ar, acompanhando um breve silêncio.
      - Ó António, puxa uma cadeira e bebe aqui um copo connosco – convidou o Meireles, como se fosse o dono da casa.
António tirou o boné e aproximou-se, respeitoso. O resto do grupo não sabia o que pensar. Seria que o Meireles ainda não sabia de nada? António interrompeu-lhes os pensamentos:
      - Se o Sr. Meireles pudesse ir logo direto ao assunto, agradecia. É que ainda tenho uns afazeres, no Cabeço.
      - Com certeza, António. Então, é o seguinte: a minha cunhada Clotilde disse-me que a minha filha anda cismada em…
A conversa foi interrompida por Alexandre que acabara de entrar, dar as boas tardes e pedir um café.
      - Alexandre?! O que é que tu estás aqui a fazer? – perguntou, incrédulo, o pai.
      - Porquê a admiração, pai? Que eu saiba, não estou a invadir propriedade privada, ou estou?
António não pode deixar de sentir algum embaraço, com a resposta do filho.
      - Claro que não, mas fazia-te na serração – respondeu
      - Na serração está tudo em ordem. Vou ali ao sapateiro, buscar umas botas, e já passo por aqui, para irmos juntos para cima.
Já Alexandre alcançava a porta, quando ouviu a voz do Meireles:
      - Ó rapaz, ao menos, bebe uma cerveja connosco!
      - Obrigado, Sr. Meireles, mas eu não bebo! – retorquiu Alexandre
      - Não bebes?! Mas isso é um defeito imperdoável, num homem!
      - E aposto que esse nem sequer é o meu pior, pois não, Sr. Meireles? E saiu, provocando algum desconcerto, no grupo.
Foi o Rodrigues da Quinta de Cima que quebrou o silêncio:
      - Ó António, este teu filho tem pelo na venta!
Bem, como eu ia dizendo …- atalhou o Meireles, apressadamente – a minha cunhada disse-me que a minha filha anda cismada …fez uma pausa, sorveu o resto da cerveja e posou o copo na mesa. Todos os presentes sustiveram a respiração.
      - Vocês sabem como são as mulheres! Pois, ela meteu na cabeça que quer construir uma estufa, na parte poente do jardim, Diz que, em certas alturas do ano, aquela zona se torna muito quente e que gostaria que a família pudesse aproveitar mais essa área.
Todos respiraram fundo. Sobretudo António, a quem acabavam de tirar um peso das costas.
E o Meireles continuou:
      - Queria saber se estão interessados no trabalho, mas não se ponham com ideias, porque também já pedi um orçamento ao Abílio Figueira e não quero gastar muito dinheiro!
      - O senhor sabe que o Abílio Figueira trabalha mais barato do que nós, por isso, é possível que não haja negócio.
      - Eu sei, mas sou um homem prevenido. Pela certa, a minha filha vai rejeitar a proposta do Abílio, sem sequer olhar para ela. Por isso, é melhor não perdermos tempo – retorquiu o Meireles, fazendo jus ao seu sentido prático.
      - A menina Maria Teresa lá saberá o que tem contra o Abílio Figueira, mas acho que os custos devem ser tomados em consideração – opinou António.
      - O problema não é o que ela tem contra o Abílio – que não é nada – é o que ela tem a favor do Alexandre – contrapôs o Meireles, impávido e sereno.
A estupefação estampou-se no rosto de todos os presentes. Ainda mal recomposto, o Gouveia gracejou:
      - Cá para mim, a menina Maria Teresa está é a ver se arranja um sítio bom para namorar, que o verão está a chegar e parece que vai ser quente.
      - É possível! As mulheres são muito manhosas! Mas já que o trabalho é para se fazer, é melhor que seja feito por uma das partes interessadas, sempre dá alguma garantia de que fica em condições!- concluiu o Meireles, visivelmente bem-humorado.
As despedidas saíram um pouco atabalhoadas e, contrariamente ao que era costume, de repente, todos tinham algo de inadiável para fazer. É que, as novidades são três dias e aquele já ia quase no fim, havia que aproveitar o tempo.



                                                                                                ( Continua )




terça-feira, 18 de junho de 2013

A MADRINHA (2)

Maria de Jesus parecia apostada em que a aldeia a tomasse a sério. Na família, fez questão de chamar a si as tarefas mais duras da casa e de acompanhar os irmãos nos trabalhos do campo. O pai possuía uma pequena forja nas imediações da habitação e era lá que passava a maior parte dos dias. Quando havia menos trabalho, acompanhava os filhos no amanho das poucas courelas que possuíam, mas nem nessa altura, a filha deixava de os acompanhar. Os progenitores bem opinavam que ela se podia revezar com a mãe entre as tarefas domésticas e as do campo, mas Maria de Jesus mostrava-se irredutível. Preferia passar o dia ao sol ou à chuva a embrenhar-se em todas aquelas tarefas rotineiras e com alguns horários à mistura. Dormia muito pouco, sempre achou um desperdício passar tantas horas sem fazer nada. Quando todos descansavam, gostava de andar pela casa, ajeitando pequenas coisas, em silêncio, olhando, com olhos de ver, como ela dizia, os vestígios que as pessoas que a habitavam iam deixando nelas.

 Aos 27 anos, Maria de Jesus estava casada e a braços com os três filhos com que a vida a presenteou. As irmãs fizeram a sua vida por Lisboa e os dois irmãos dedicaram-se a ampliar o negócio do pai ao qual foram acrescentando outras funcionalidades, sempre com a ajuda de António, o fiel serviçal que ali prestava valorosos serviços desde os quinze anos, só interrompidos pelo cumprimento do serviço militar. Quando regressou da tropa, a família achou ser da mais elementar justiça oferecer-lhe sociedade no negócio, tanto mais que todos sabiam que, sem ele, a possibilidade de sucesso estaria seriamente ameaçada, não só devido à inexperiência dos rapazes, nessas áreas, mas também ao facto de as condições de saúde do pai começarem a ser fonte de alguma preocupação. É claro que, por detrás de todas estas mudanças, estava a visão de Maria de Jesus para quem se tornava evidente que as parcas terras que possuíam não iriam assegurar, por muito mais tempo, o sustento da família que tendia a crescer, com cada um a querer seguir a sua própria vida e, ao mesmo tempo, a querer manter-se por perto. Além disso, Maria de Jesus também tinha os seus planos…E neles, entrava António. E o tempo seguiu o seu curso.

O seu primeiro sobressalto aconteceu quando Alexandre, o filho do meio, aos 23 anos, se perdeu de amores por Maria Teresa, a rica herdeira da aldeia. Criada sem mãe, que não sobreviveu ao parto, Maria Teresa contara com a total dedicação da tia Clotilde, solteira, que se mudou para a Casa dos Álamos onde vivia a família, sob o olhar atento e austero do pai, Antero Meireles, que via em todos quantos se aproximavam da filha e da família, em geral, uma cambada de oportunistas cujo único objetivo era aliviarem-no do peso da fortuna. Só um grupo restrito de amigos, com quem confraternizava ao fim da tarde, no único café da aldeia, merecia a sua confiança e, mesmo assim, nunca deixava que a barreira de segurança fosse ultrapassada. Não era fácil negociar com ele e era bom que a ninguém passasse pela cabeça tentar enganá-lo. Quando o rumor da inclinação do filho pela filha do Meireles chegou aos ouvidos de António, a preocupação estampou-se-lhe de tal forma no rosto que Maria de Jesus o interpelou, alarmada:
      - Credo, homem, parece que viste um fantasma! O que é que te aconteceu?
    - Vem aí borrasca! É melhor preparares-te. Parece que o nosso Alexandre e a Maria Teresa Meireles gostam um do outro. Espera, até o pai dela saber.
      - E achas que ele não sabe já? – perguntou a mulher, com a sua serenidade habitual.
      - Não pareces muito surpreendida! – estranhou António.
      -Tenho olhos na cara e garanto-te que o pai dela também. Não vale a pena preocupares-te, por antecipação. O que for, soará!

O local onde viviam era conhecido pelo Cabeço e constituía um aglomerado um pouco à parte da aldeia, não só porque mediava alguma distância entre ambos, mas também porque o acesso era difícil e impedia o uso de qualquer veículo motorizado. Maria de Jesus raramente descia ao povoado e era o marido quem, duas vezes por semana, se abastecia dos mantimentos necessários ao sustento da família, na mercearia do velho Antunes. No caminho, por incumbência da mulher, tratava de saber notícias dos doentes da aldeia e, com alguma regularidade, entregar à professora - uma regente escolar que mal ganhava para comer e já teria partido, de volta para a família, se não fosse a ajuda e o incentivo dos habitantes da aldeia – um cesto de víveres e alguns mimos caseiros com que fazia questão de a presentear. A missa de domingo era, pois, a única ocasião em que Maria de Jesus era vista pelos restantes aldeãos, juntamente com a família, num ritual em que o religioso e o social se misturavam proporcionalmente ao gosto e fé de cada um, mas que, para todos, constituía um momento alto da vida comunitária.

Naquele domingo, no regresso a casa, Maria de Jesus caminhava ao lado do marido e dos filhos, quando, para sua surpresa, vê o pai de Maria Teresa abandonar  o grupo com quem conversava a aproximar-se deles, com passo estugado.
      - Boa tarde, a todos! Ó António, preciso de te dar uma palavrinha. Quando cá vieres abaixo, espreita se eu estou lá pelo café da terra, para falarmos.
      - É alguma coisa urgente? – indagou António, não escondendo algum nervosismo.
      - Não, mas quanto mais cedo for resolvido, melhor.
E despediram-se.
À noite, ao jantar, aproveitando estar a família toda reunida, o pai perguntou, um pouco à queima- roupa:
      - Alguém faz ideia do que é que o Meireles me quererá?
Todos responderam negativamente, exceto Alexandre que respondeu num tom algo desabrido:
      - O pai, não se esqueça de ir já a correr ver o que é que o senhor quer! Se tiver pressa, que venha cá acima porque,  se sujar  as botas, tem lá muitos criados para lhas limpar!
      - Estou a ver. Bem me parecia que tu sabias de que se trata -  retorquiu o pai contendo  um sorriso velado.
E a conversa ficou por ali.

      
                                                                                                   ( Continua )








sábado, 15 de junho de 2013

A MADRINHA (1)

A memória do tempo vivido na aldeia tinha-se estilhaçado em mil fragmentos e transformado numa cacofonia de mil sons, quase todos a preto e branco. Em vão, Maria Clara tentava encontrar um fio condutor, uma ordem cronológica, uma sequência de factos, mas nada batia certo. Só a madrinha que, na realidade, era sua avó, dava sentido a todas as suas memórias. E, naquele dia, vá-se lá saber porquê, não lhe saía da cabeça o que a madrinha lhe dizia, amiúde:
       - Tudo o que fazemos não nos compromete só a nós. Um pequeno pormenor e as nossas vidas e as dos que nos rodeiam podem seguir caminhos completamente diferentes daqueles que nos pareciam conformes.
Sorriu. Tinha a certeza que, embora contemporâneos, a madrinha nunca tinha ouvido falar de Edward Lorenz e muito menos da sua alegoria do Efeito Borboleta. Mas estava tudo lá. Aliás, como sempre. A madrinha sabia tudo…por intuição.

Aos 20 anos, Maria de Jesus, a avó - madrinha, tinha deixado a aldeia muda de espanto quando, inexplicavelmente, trocou a vida na capital pela vida na aldeia onde, aliás, tinha sido nada e criada. Era a segunda mais velha dos cinco irmãos e a mais velha das raparigas. Numa família pobre como a dela, todos consideraram um golpe de sorte terem conseguido, por intermédio de uma prima afastada que vivia em Lisboa, arranjarem casas na capital onde as raparigas pudessem servir. Pelo menos, livravam-se das agruras do campo, onde estavam destinadas a trabalhar de sol a sol, como todas as demais. As notícias que iam chegando à aldeia davam conta de que as raparigas estavam bem e que eram estimadas pelos patrões. Isso era bom. Não se podia pedir mais. Nas suas visitas à terra, Maria de Jesus era a que mais se destacava, não só porque se ia tornando uma bela rapariga, mas porque ia adquirindo alguma elegância de gestos e a sua linguagem se distinguia, claramente, da das gentes da terra e da das próprias irmãs. Até que um dia, os devotos que assistiam à missa do Domingo de Ramos foram surpreendidos pela entrada de Maria de Jesus, na Igreja, não se fazendo acompanhar pelas irmãs, como era seu costume. Envergava, contava-se, um lindo vestido azul, de lã fininha, rematado, no decote, por uma discreta penugem branca. A mantilha, também branca e presa ao toucado, artisticamente delineado no alto da cabeça, por um alfinete de rara beleza, completava o quadro digno de um conto de fadas. Á medida que os fiéis se foram apercebendo da sua presença, as cabeças foram-se voltando e os cochichos foram-se propagando pela igreja, em surdina. À saída, lá estavam as perguntas à sua espera:
      - Então as tuas irmãs, não vieram contigo?
      - Não, desta vez, não. Só virão no verão.
      - Então, e o que é que te traz por cá, nesta altura? A tua mãe, não está doente, pois não?
      - Não, graças a Deus! Eu venho para ficar…
      - Para ficar?! – perguntou, quase em uníssono, o grupo que a tinha rodeado, não escondendo o seu grande espanto.
      - Mas o que é que te aconteceu, por lá, rapariga?
      - Nada de especial. Eu é que não quero passar o resto da minha vida enfiada numa grande cidade. Os ares, por aqui, são mais puros! 
       - Mas, tu agora já não vais conseguir acostumar-te a esta vida, Maria de Jesus!
       - Isso, o tempo o dirá! E mais não disse.

Mais difícil, foi convencer a mãe, dos seus motivos. Na sua ideia, alguma desgraça tinha acontecido à filha para ela ter regressado assim, sem mais nem menos. E a prima que só viria para as festas ou talvez mesmo só pelo Natal! Nem sabia como é que iria aguentar aquele tempo todo sem saber tudo, tintim por tintim.
      - Ó mãe, sossegue, não me aconteceu nada! Eu só acho é que tenho direito a uma vida melhor!
      - Uma vida melhor?! Aqui?! Ai filha, tu não deves estar boa da cabeça!
E nessa noite, entre lágrimas e preces, a pobre senhora pediu a Deus que iluminasse a filha e a fizesse voltar atrás, pois não era possível que ela imaginasse o que a esperava, por aquelas bandas.
Mas imaginava. E era exatamente pelo que imaginava que Maria de Jesus tinha regressado. Aquela era a sua escolha.

No dia seguinte, logo pela manhã, Maria de Jesus foi à venda do Sr. Antunes e comprou duas folhas de papel de seda e dois metros de fita de cetim. Enquanto dobrava o papel e fazia o troco, o Sr. Antunes atirou, em tom jocoso:
      - Então, parece que trocaste a cidade pelo campo! Pois, olha, quem te tivesse comprado ontem e te vendesse hoje, perdia dinheiro! Ontem, parecias uma rainha!    
      - Então, o Sr. Antunes não tem grande olho para o negócio! – retorquiu, de pronto, a rapariga. Garanto-lhe que valho mais hoje do que ontem. E, saiu, sem sequer lhe dar tempo para se recompor.

                                                                                                            ( Continua )